Policiais
civis e promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado
(Gaeco), do Ministério Público estadual, cumprem, na manhã desta quinta-feira, (29). 96 mandados de prisão expedidos pela Justiça contra policiais militares
acusados de receberem propina de traficantes para não combater o tráfico de
drogas em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. A ação foi batizada de
operação Calabar — em referência a Domingos Fernandes Calabar, considerado o
maior traidor da história brasileira. Além dos PMs, a Justiça expediu também
mandados de prisão contra traficantes. No total, são 184 mandados de prisão. O
esquema movimentava cerca de R$ 1 milhão de reais por mês.
As
equipes estão em bairros de Niterói, na Região Metropolitana do Rio, e também da
Zona Oeste do Rio. No Ingá, em Niterói, agentes estiveram no prédio do cabo
Fernando Cataldo Côrtez, um dos suspeitos de integrar o esquema. Segundo a
Polícia Civil já há PMs presos.
Todos
os agentes alvos da operação são praças e foram lotados no 7º BPM (São Gonçalo)
entre 2014 e 2016. A quantidade de policiais acusados de corrupção representa
cerca de 15% do efetivo da unidade, composta por pouco mais de 700 homens. De
acordo com a investigação, semanalmente os agentes recebiam cerca de 250 mil
reais de propina do tráfico. Segundo a Polícia Civil, essa é a maior operação
de combate à corrupção policial já feita no Estado do Rio.
A
investigação começou em fevereiro de 2016, quando agentes da Delegacia de
Homicídios de Niterói e São Gonçalo (DHNSG) prenderam, em flagrante, com três
armas de fogo e dinheiro em espécie, Sandro de Oliveira Vinhas. A partir de
então, o homem — apontado como uma espécie de “gerente da propina” do tráfico
do município, responsável por centralizar o transporte do dinheiro e o
pagamento a diferentes grupos de policiais — aceitou colaborar com os agentes
em troca de uma diminuição em sua pena.
As
equipes em frente a um prédio no Centro de Niterói Foto: Rafael Soares /
Agência O Globo.
Numa
série de depoimentos prestados na especializada, Sandro esmiuçou como era o
esquema de distribuição de propina do tráfico entre os PMs do 7º BPM, apontou
os nomes de 96 agentes que recebiam valores semanalmente e entregou uma lista
de números de telefones utilizados por policiais e por traficantes responsáveis
pelos pagamentos. Segundo o relato do colaborador, o tráfico distribuía cerca
de 250 mil reais semanalmente entre PMs que trabalhavam nos Grupos de Ação
Tática (GATs), na P-2 (Serviço Reservado) do batalhão, em Destacamentos de
Policiamento Ostensivo (DPOs) nos bairros do Salgueiro, de Santa Luzia, de
Santa Izabel, do Jockey, do Jardim Catarina, e as ocupações dos morros da
Coruja e do Alto dos Mineiros. A entrega do dinheiro era feita, geralmente, nas
noites de sábado.
Em
troca do pagamento, os policiais deveriam evitar operações em 44 favelas de São
Gonçalo dominadas pela maior facção do Rio. A divisão era feita de acordo com a
lotação dos policiais e com o perigo que esses agentes representavam para a
facção. Por exemplo: cada GAT — grupos de agentes responsáveis por incursões em
favelas — recebia R$ 20 mil por semana; já PMs baseados em cada um dos DPOs
recebiam R$ 7,5 mil.
O
dinheiro da propina era entregue para Daniel Soares e Renato Amarelo. Eles
repassavam as quantias para os policiais militares.
Quebra
de sigilo telefônico
Com
base nos relatos do colaborador, a Justiça decretou a quebra de sigilo
telefônico dos policiais. A partir do monitoramento das linhas, os agentes
descobriram que os agentes e os traficantes usavam celulares “buchas” —
aparelhos utilizados somente para atividades ilícitas, para dificultar o
rastreamento. Todas as ligações telefônicas foram periciadas para verificar se
o padrão de voz de pessoas que utilizaram celulares “buchas” coincidia com o
dos policiais militares.
Ao
longo das investigações, os agentes descobriram que, mesmo após a prisão de
Sandro, os valores continuaram a ser pagos. O posto de “gerente da propina”
passou a ser ocupado por Daniel Soares, que foi preso ao longo do
monitoramento, em abril de 2016, com R$ 9,5 mil num carro. Daniel não aceitou
colaborar com as investigações.
Outra
prisão em flagrante realizada pelos agentes da DHNSG durante as investigações
foi a do cabo Marcelo Bento Vindile. Ele foi flagrado à paisana num carro, em
abril de 2016, com outros três homens, R$ 2,2 mil reais em espécie, duas armas
e pinos de cocaína.
Os
PMs acusados vão responder por organização criminosa e corrupção passiva.
Fonte e Foto: Rafael Soares / Agência O Globo