sábado, 5 de janeiro de 2019

A felicidade do Ano Novo durou só até o primeiro estrondo


Em artigo no O POVO deste sábado (5), a jornalista Letícia Alves aponta que a vinda de homens da Força Nacional alivia um pouco o medo, mas não é o suficiente para trazer de volta a esperança de um novo ano. Confira:

O clima de Ano Novo nem havia cessado quando moradores de Caucaia escutaram um estrondo e sentiram a terra tremer na madrugada do dia 3 de janeiro. O barulho era de uma explosão em viaduto na BR-020, ataque que, junto com o incêndio de dois ônibus, inaugurou nova onda de terror causada por facções criminosas no Ceará. Desde então, não escutei mais desejos de “feliz ano novo” sendo trocados entre amigos, familiares e colegas de trabalho. Foi-se embora a esperança?

Infelizmente, essa situação não é mais novidade para a população cearense. Só em 2018, foram três ciclos de ataques a ônibus e prédios públicos e particulares; em 2017, outros dois; e em 2016, absurdas cinco ondas de ações criminosas generalizadas – segundo dados de edição do O POVO de ontem. Durante o segundo semestre do ano passado, experimentamos uma paz até estranha, levando em conta esses números, mas ela mal esperou a virada do ano (ou a posse dos governantes).

O caos na segurança do Ceará repercutiu em todo o Brasil e chegou ao governo federal com maior rapidez do que das outras vezes. Ainda no dia 3, à tarde, o governador Camilo Santana (PT) anunciou conversa com Sergio Moro, ministro da Justiça e da Segurança Pública, e solicitação da Força Nacional. Em julho do ano passado, mesmo após cinco dias de terror, o Governo do Estado se negou a recorrer a essa medida.

A vinda de homens da Força Nacional alivia um pouco o medo, mas não é o suficiente para trazer de volta a esperança. Primeiro, porque até numa situação de caos como essa, a hostilidade entre os governos estadual e federal ficou evidente na fala do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que fez questão de destacar “incapacidade” de Camilo de resolver o problema. Ora, incapaz ou não, o pedido de ajuda é sempre clamado pela população, e finalmente foi ouvido. Bolsonaro tinha mais era de atender.

A média de duração dessa onda de ataques fica entre três e quatro dias. Entramos no terceiro, mas estatísticas não garantem que estamos nos aproximando do fim. Ainda mais porque todos sabem que a paz que experimentamos é ilusória e acontece enquanto a guerra continua a ser engendrada pelas facções criminosas de dentro dos presídios. É necessário ultrapassar entraves ideológicos para discutir resoluções reais. O cidadão não merece ficar à mercê dessa violência.

*Letícia Alves


Jornalista do O POVO.